Os últimos 30 anos transformaram o mundo! Neste contexto, também está a advocacia em transformação! E não há nada, absolutamente nada, que possamos fazer para mudar isto…
Do nascimento da Constituição Federal de 1988 até aqui, não foram poucos os fatos que geraram impacto para todos nós, advogados: Código do Consumidor (1990), Exame da Ordem (1994), Lei dos Juizados Especiais (1995), Google (1998), boom do Vale do Silício (pós ano 2000), ataque às Torres Gêmeas (2001), criação do Facebook (2004), criação do Watson (2010), dentre outros tantos acontecimentos que marcaram para sempre o nosso futuro.
Da Advocacia 1.0 (do “eu sozinho”) até a versão 4.0 (das sociedades de advogados digitais) o limite de atuação, o perfil do advogado, o perfil do cliente, os conceitos de papel, de processo, de audiência, de reunião de equipe, de atendimento ao cliente, de gestão do contencioso, de marketing jurídico e as necessidades de gestão passaram por uma reinvenção jamais vista. Sem falar na explosão do número de advogados no mercado: mais de 1,2 milhão. Ou seja, a advocacia não só esteve, mas continua em transformação.
Os próximos 20 anos continuarão transformando o mundo, só que numa velocidade muito maior da que experimentamos até aqui. Teremos que aprender a conviver com a jurimetria, com a estatística processual, com a Lei Geral de Proteção de Dados, com o compliance, com a identificação biométrica, com os robôs que aprendem, com os escritórios sem papel, e muitas outras novidades que ainda estão por vir trazidas pelas mãos de gente inovadora e que pensa além da caixa nas lawtechs.
A grande verdade (ainda dolorosa para alguns) é que a advocacia romântica foi substituída pela de resultados. E ter resultados nos tempos atuais requer mais (bem mais) do que ainda se aprende nos bancos da faculdade de Direito. O advogado da Advocacia 4.0 traz um misto do idealismo e sonho de Dom Quixote e a visão multitecnológica de Neo (do filme ‘Matrix’). Ou seja, precisa aprender a lidar com as novas roupagens que substituíram velhas formas de trabalho, bem como adquirir novos conhecimentos, habilidades e comportamentos que o levem ao sonhado ideal de sucesso (um termo bastante subjetivo, diga-se de passagem).
Em vista disso, os escritórios e advogados têm buscado, cada vez mais, sua inclusão no mundo da gestão moderna, visando, sobretudo, encontrar formas mais eficazes para ampliar sua capacidade competitiva, melhorar a prestação dos serviços jurídicos, atender às necessidades de seus clientes, ser um excelente lugar para se trabalhar e, no final das contas, ter maior lucratividade e melhor impacto junto ao mercado que atende.
Alcançar o sucesso nos dias atuais não é tarefa fácil, mas se nos atentarmos a alguns pontos-chave talvez seja possível que nos aproximemos dos nossos grandes e sonhados objetivos.
Exercitar o hábito do planejamento fará com que o escritório esteja mais bem preparado para o futuro e, conseqüentemente, para construir sua sustentabilidade. No “normal” mundo V.U.C.A., essa habilidade se torna cada vez mais desafiadora e necessária.
Para ser competitivo, o escritório deverá adquirir expertise no(s) segmento(s) da Advocacia de sua vocação: padronizada (massa), customizada, especializada e/ou científica. Seja qual for o segmento escolhido, ele precisa ser gerenciado adequadamente e executado com excelência para que a banca possa impor sua superioridade e, assim, fortalecer sua posição junto ao cliente e ao mercado.
Isto significa agregar valor na tomada de decisões dos sócios quando o assunto for dinheiro. Quanto melhores forem as informações gerenciais, mais fácil será elaborar orçamentos e planejamentos, analisar a rentabilidade (estamos tendo lucro ou não?) e, assim, tomar decisões mais acertadas e pé-no-chão.
Trabalhar em equipe hoje é uma condição para que o escritório consiga equilibrar a qualidade dos serviços prestados com a eficiência (fazer o certo, da forma certa e no tempo certo). E é na equipe que está a grande força competitiva do escritório. Termos como cooperação, colaboração, co-criação devem ser usados cotidianamente nas equipes. Aqui, se torna imprescindível o papel do líder, para levantar as bandeiras do futuro e inspirar seus membros a trilhar por um caminho luminoso.
Antes de partir para o ataque a territórios ainda não conquistados, a banca deve fazer seu dever de casa e transpirar a cultura do atendimento ao seu cliente ativo em nível de excelência de S. a S. (da secretária ao sócio). Retornar ligações, prestar contas, pesquisar suas necessidades jurídicas, ouvi-lo, entendê-lo e mantê-lo informado sobre seus processos e casos são poderosas atitudes que fazem toda a diferença. Somente assim será possível receber mais clientes, garantindo a sustentabilidade.
Não adianta inventar moda: a marca de um advogado sempre esteve, está e estará estritamente ligada à sua base de formação intelectual. Ser bom, mediano, medíocre ou excepcional é diretamente proporcional ao nível de desempenho que o advogado tem no campo do conhecimento jurídico, da moral e da ética. Acrescentamos que ele precisa dominar outras áreas do conhecimento (como economia, finanças, psicologia, tecnologia, línguas, etc.), saber trabalhar em equipe, ser empreendedor, ser organizado, ser adaptável, administrar bem o tempo, cuidar do marketing pessoal, de sua reputação, dentre outros.
Muito mais que imprescindível ao trabalho, significa “estar no mundo”, “se relacionar com o mundo” e “fazer parte do mundo”. A tecnologia está mudando a nossa forma de fazer as coisas simples, como chamar um táxi ou reservar um quarto de hotel. Não será diferente na advocacia. Conviver com sistemas que auxiliem nas pesquisas jurídicas, nos lançamentos de informações repetitivas nos sistemas, nas análises inteligentes das carteiras de processos judiciais, no relacionamento fluido com o cliente será parte das nossas rotinas, assim como é ler as publicações do dia.
Ano após ano e com visão de longo prazo que privilegie a sustentabilidade, tornar-se-á possível equilibrar filosofia de trabalho compartilhada com toda a equipe, competência técnica, excelência no atendimento ao cliente e lucratividade.
Já caminhamos bastante, mas é preciso mais. Torna-se necessário descortinar a realidade desse mercado tão complexo, desenvolver-treinar-crescer o pilar que dá sustentabilidade à toda e qualquer banca: o humano, e prover ferramentas modernas para que se eleve o nível de qualidade dos serviços entregues aos clientes, da dinâmica do ambiente de trabalho em que os profissionais atuam, bem como das estratégias competitivas.
Todo esforço no sentido de qualificar melhor a advocacia brasileira não somente justifica-se, como deve ser apoiado sob todos os pontos de vista pois, como demanda Victor Hugo, precisamos “mudar nossas opiniões, sustentar nossos princípios, trocar nossas folhas, e manter intactas nossas raízes”. Isso é evoluir!
Gostou de saber mais sobre a advocacia em transformação? Então assista ao vídeo a seguir, no qual Lara Selem fala mais sobre o assunto.
Texto de Lara Selem: advogada, professora, escritora e consultora em Gestão Legal, especialista em Sociedades de Advogados, Planejamento Estratégico e carreira jurídica. Executive MBA pela Baldwin Wallace College (EUA), especialista em Gestão de Serviços Jurídicos pela FGV-EDESP (São Paulo, SP) e em Liderança de Empresas de Serviços Profissionais pela Harvard Business School (EUA). Autora dos livros “Advocacia: Gestão, Marketing & Outras Lendas” (Consulex, 2009), “Gestão de Escritório” (Consulex, 2008), “A Reinvenção da Advocacia” (Forense/Fundo de Cultura, 2005), “Gestão Judiciária Estratégica” (ESMARN, 2004), “Estratégia na Advocacia” (3a Ed., Juruá, 2013). Co-coordenadora da obra “Gestão Estratégica do Departamento Jurídico Moderno” (Consulex, 2010). Fundadora da Selem Bertozzi Consultoria e do Instituto Internacional de Gestão Legal. Membro-consultora da Comissão Nacional de Sociedades de Advogados do Conselho Federal da OAB (2016-2018), da Comissão de Inovação e Gestão da OAB/PR (2016-2018) e da Comissão da Mulher Advogada da OAB/PR. Membro e Co-Chair de GLA Association of Legal Administrators (ALA) Brazil Section para Sul e Nordeste, e integrante do International Relations Committee da mesma associação (2018-2020). Membro do Conselho Técnico da Forelegal.